Um levantamento do Colégio Notarial do Brasil indica que os divórcios extrajudiciais subiram 26,9% de janeiro a maio de 2021 no Brasil. Os números já vinham crescendo, nos últimos dois anos, 75.033 casais oficializaram a separação. Com a pandemia do coronavírus, a mudança de trabalho para o âmbito de home office intensificou a convivência e colocou à tona conflitos que muitas vezes culminaram em separação.
No confinamento, problemas que antes eram ignorados tornam-se mais evidentes. O psicólogo André Barbosa explica que evitar enfrentar as divergências entre casal é uma tendência: “muitos casais estão vivendo relacionamentos “harmoniosos” às custas de ir colocando problemas, divergências, insatisfações para debaixo do tapete em nome de manter a paz” afirma.
André Barbosa avalia que a longo prazo, esse comportamento custa o próprio relacionamento: “o preço que se paga por isso é que perde-se a vontade de estar junto, afetando o sentimento e, em casos mais graves, ficar até indiferente ao outro, culminando em separação”, constata o psicólogo.
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Ao longo dos anos, muitos especialistas destacam a falta de diálogo como uma das principais causas para a separação. A partir da comunicação, é possível conquistar novos aprendizados e construir relações duradouras. André Barbosa diz que: “quando não comunico adequadamente o que me feriu, nego ao outro a oportunidade de reparação”, pontua.
Separar ou não, eis a questão
Há vários textos bíblicos que apoiam os argumentos daqueles que defendem a tese de que o casamento é indissolúvel. Em Mateus 19, o próprio Jesus responde às perguntas dos fariseus acerca do divórcio. “E aconteceu que, concluindo Jesus estes discursos, saiu da Galiléia, e dirigiu-se aos confins da Judéia, além do Jordão. E seguiram-no grandes multidões, e curou-as ali. Então chegaram ao pé dele os fariseus, tentando-o, e dizendo-lhe: É lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo? Ele, porém, respondendo, disse-lhes: Não tendes lido que aquele que os fez no princípio macho e fêmea os fez, E disse: Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se unirá a sua mulher, e serão dois numa só carne? Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem. Disseram-lhe eles: Então, por que mandou Moisés dar-lhe carta de divórcio, e repudiá-la? Disse-lhes ele: Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres; mas ao princípio não foi assim. Eu vos digo, porém, que qualquer que repudiar sua mulher, não sendo por causa de fornicação, e casar com outra, comete adultério; e o que casar com a repudiada também comete adultério”.
O apóstolo Paulo, em sua primeira carta ao povo de Corinto, também fala sobre o tema de forma inflexível, no capítulo sete. “Todavia, aos casados mando, não eu mas o Senhor, que a mulher não se aparte do marido. Se, porém, se apartar, que fique sem casar, ou que se reconcilie com o marido; e que o marido não deixe a mulher. Mas aos outros digo eu, não o Senhor: Se algum irmão tem mulher descrente, e ela consente em habitar com ele, não a deixe. E se alguma mulher tem marido descrente, e ele consente em habitar com ela, não o deixe. Porque o marido descrente é santificado pela mulher; e a mulher descrente é santificada pelo marido; de outra sorte os vossos filhos seriam imundos; mas agora são santos. Mas, se o descrente se apartar, aparte-se; porque neste caso o irmão, ou irmã, não está sujeito à servidão; mas Deus chamou-nos para a paz. Porque, de onde sabes, ó mulher, se salvarás teu marido? ou, de onde sabes, ó marido, se salvarás tua mulher?”.
O texto é claro, mas não resolve o problema de quem sofre dia a dia com uma convivência difícil. Em grande parte, quando se chega a esse ponto, já não há mais amor entre os cônjuges. Então, a solução seria viver uma vida acorrentado à tristeza, abrindo mão assim da possibilidade de uma vida supostamente mais feliz? Diretor e conferencista do Oikos, ministério cristão de apoio à família, Gilson Bifano diz que a argumentação de que o amor acabou e, em consequência, não há por que lutar para reatar o casamento, não condiz com a realidade do problema.
“O amor acaba porque os casais não o alimentam. Amar é uma decisão. Todos os dias deve haver disposição de amar o cônjuge. O abandono do casamento não é da vontade de Deus, especialmente para os casais cristãos. Eu diria que os casais com dificuldades deveriam lutar pelo casamento, procurar ajuda através de um aconselhamento, ou uma terapia. Se os casais lutarem por seus casamentos, teremos, com certeza, menos divórcios” diz ele, de forma simples.
Com a mesma esperança na restauração, por vezes milagrosa, o pastor Narciso Marques, coordenador do ministério Casados Para Sempre, da Igreja Batista de Lagoinha, em Belo Horizonte (MG), diz que receberá aproximadamente 200 casais, divididos em 33 grupos, apenas no primeiro semestre deste ano. O ministério tem diversos programas para o fortalecimento da vida a dois daqueles que querem prevenir uma crise ou mesmo para aqueles que já vivem uma realidade dolorosa. Há encontros, acampamentos de casais e oportunidades para aconselhamento individual e, até mesmo um curso de finanças para a família – área que costuma gerar muitos conflitos.
“Recebemos casais com todo tipo de problemas, não dá nem para descrever. São coisas inusitadas até, desde casos em que o casal não consegue tirar o filho já crescido da cama deles até os que se separaram devido aos filhos terem graves problemas com drogas. Há aqueles que já estão com aos papéis do divórcio em andamento. Mas, não importa a situação, se houver o interesse e empenho dos dois, a coisa é reversível, por mais caótica que seja aos olhos do homem. Deus age. É isso que nos diferencia de outros grupos de apoio não crentes. Nós, evangélicos, contamos com a intervenção divina!”.
Já o pastor Julio César de Araújo, um dos líderes do ministério Casados Para Sempre criado pela Igreja Evangélica Congregacional do Brasil, destaca, do alto de seus 11 anos de experiência no treinamento de casais e de conselheiros matrimoniais, a preocupação com os efeitos sobre a família. Ele afirma que pode ser afetada de uma forma muito traumática. “Quando há a quebra de aliança com Deus e, por consequência, a separação do casal, vai haver uma série de transtornos na família, seja pela ausência da figura do pai ou da mãe, principalmente quando as crianças são pequenas, na primeira infância. Isso afeta demais o lado emocional e o espiritual das crianças. Tem gente que diz que, após se divorciar, a convivência com os filhos melhorou, mas isso não existe, é balela. Filhos de pais separados têm dificuldades que, por vezes, se manifestam por toda vida”, diz.