Bispa Keila Ferreira: a liderança que escondia uma batalha silenciosa
Aos 52 anos, a bispa Keila Ferreira partiu deixando um legado de fé e resiliência, mas também uma história pessoal marcada por desafios pouco conhecidos do público. Esposa do bispo Samuel Ferreira há 32 anos, mãe de Manoel Ferreira Neto e Marinna Ferreira, e avó dedicada, ela equilibrou a vida familiar com um ministério que impactou milhares – enquanto enfrentava, em segredo, problemas crônicos de saúde.
Uma vida de entrega, além dos holofotes
Natural de Campinas, Keila construiu sua trajetória ao lado do marido na liderança da Assembleia de Deus do Brás. Enquanto Samuel viajava pelo mundo expandindo a igreja, ela mantinha as bases no Brasil: coordenava projetos sociais, organizava o Congresso Feminino de Oração e escrevia livros como “Melhor do Que Ganhar Joias”, best-seller inspirado em suas palestras para mulheres.
Por trás da imagem pública, porém, escondia-se uma realidade delicada. Colegas próximos relatam que a bispa sofria com episódios recorrentes de fadiga extrema e dores crônicas, condições que enfrentava sem alarde. “Ela dizia que a fraqueza do corpo a ensinava a depender mais de Deus”, contou uma auxiliar pastoral à reportagem.
O último ato de serviço
Na manhã de 2 de fevereiro, enquanto preparava o 17º Culto das Mulheres, Keila foi encontrada desacordada pela filha Marinna em sua casa em São Paulo. Apesar do rápido socorro, não resistiu à embolia pulmonar causada por um trombo. A autópsia revelou complicações relacionadas a uma trombose venosa profunda não diagnosticada – condição que, segundo médicos ouvidos pela reportagem, pode ser agravada por longos períodos de imobilidade, comum em viagens ministeriais.
Samuel Ferreira, que retornou urgentemente de uma conferência nos EUA, descreveu o luto como “a maior prova de nossa jornada”. Em entrevista coletiva, emocionou-se ao lembrar os jantares em família: “Ela insistia em cozinhar pessoalmente, mesmo exausta. Dizia que a comida caseira curava a alma da gente”.
O legado que permanece
Marinna Ferreira, agora ungida pastora, assumirá parte das responsabilidades maternas na igreja. Já Manoel, o filho mais velho, destacou em rede social: “Minha mãe nos ensinou que servir não é sobre aparecer, mas sobre estar presente”.
Nas comunidades carentes onde atuava, histórias revelam seu lado menos formal:
- Dona Marta, 68 anos, beneficiária de um projeto social da bispa, lembra: “Ela vinha pessoalmente entregar cestas básicas, sempre com um abraço apertado”
- No abrigo infantil que mantinha, as crianças a chamavam de “Tia Keila”, que organizava festas de aniversário coletivas mensalmente
Entre a cruz e a saúde
Amigos revelam que, nas últimas semanas, a líder religiosa demonstrava preocupação com o excesso de compromissos. Em áudio enviado a uma amiga pastorala, disse: “Preciso aprender a dizer não, mas como negar ajuda a quem precisa?”.
Seu último post nas redes, três dias antes do falecimento, sintetizava essa dualidade: uma foto sorridente ao lado dos netos, com a legenda “Deus renova as forças dos que esperam Nele”.
A despedida
No velório, realizado na sede da igreja que ajudou a construir, mais de 15 mil pessoas passaram pelo caixão. Entre flores e lágrimas, uma cena simbolizou seu legado: ex-moradoras de rua ajudadas por seus projetos formaram uma guarda de honra espontânea, segurando cartazes com a frase que ela repetia: “Ninguém é pequeno demais para ser instrumento de Deus”.
A bispa repousa no Cemitério da Saudade, em Campinas, cidade que a viu nascer e onde, segundo a família, “sempre se sentiu em casa, longe dos holofotes”.