Por Ricardo Gondim
A pergunta martela: Por que recuso abandonar a saudade do que um dia me encantou? Não sei responder. Quem sabe hospede uma obstinação juvenil de me considerar eterno. Se olho para a vida e me angustio, igualmente, tento me convencer de que sou imortal. Insisto em não desistir nesse delírio mesmo sabendo que não se fazem exceções para o fim de todos. Elaboro planos intermináveis. Desprezo Caronte e sua barca. Sei, nunca me acostumarei com o paradoxo de ser pó e desejar um porvir imenso e infinito. Esperneio. Mesmo que o imensurável fuja de mim, complexo, profundo e alto, quero saber mais como é viver sem jamais deixar de existir. Minha angustia não resolve o enigma simples da filosofia: Por que existe algo e não nada?
Tomo distância de mim mesmo. Quero ser objetivo em questionar. Admito, todavia, que me mantenho inapto para separar sonho e realidade, devaneio e racionalidade, delírio e fato.
É que vivo rodeado de ruídos – e os barulhos me protegem de atinar para o essencial. Sinto uma imensa necessidade de me acalmar. Turbilhões me fazem hesitar na aventura de meditar. Prefiro me envolver com obviedades. Gosto de pensamentos rasteiros. Permito que outros pensem por mim. Quero a disciplina de mergulhar e contemplar para frear o ímpeto de ser útil. Pois quanto mais preciso ser necessário, mais diminuo as chances de conhecer a mim mesmo. E se ignoro a minha imensidão menos alcanço Deus, o inefável.
Tenho medo do vazio. Não cesso de entupir os dias com mil demandas. Minha alma se encanta com lantejoulas falsas. Gosto de confetes. Aceito lisonja. Faço-me mundano. Relembro, entretanto, que o divino só se relevou ao profeta na calmaria. O vento estancou de repente e ele recebeu uma visita insólita. Também preciso dessa experiência. Para isso, devo rumar para o deserto. Se me atrever a vagar por trilhas solitárias, aprenderei que o imarcescível cabe no vazio e que existência e eternidade se tocam.
O Tao ensina:
Trinta raios unem um eixo,
A utilidade da roda vem do vazio.
Queima-se o barro para fazer o pote.
A utilidade do pote vem do vazio.
Rasgam-se janelas e portas para criar o quarto.
A utilidade do quarto vem do vazio.
Portanto,
Ter leva ao lucro,
Não ter leva ao uso.
A vida me pede coragem de enfrentar o vazio de nada possuir senão a mim mesmo. A resposta que tanto almejo talvez não seja sequer uma resposta, mas o convite de atrever-me aonde é possível desvencilhar-me de sobrecargas.
Quem sabe, longe das demandas da competência, sem as vozes da cobrança, eu consiga domar os dragões que tentam me impedir de encontrar meu verdadeiro self. O conselho do carpinteiro de Nazaré ressoa em meu coração: “Quem quiser ganhar a vida vai perdê-la e quem ousar perder a sua vida vai ganhá-la”. Seria esse, precisamente esse, o segredo de construir-me humano e ao mesmo tempo imortal? Acho que sim.
Soli Deo Gloria