Por Durvalina Maria de Araújo
O julgamento de Jesus Cristo é considerado o maior julgamento de todos os tempos. Não somente isso, ele também pode ser visto como o mais injusto de todas as épocas.
Jesus foi julgado, estando vigente à época, a Lei Mosaica (Hebraica ou Judaica), que teve sua perpetuidade destacada pelo estadista bíblico Moisés, embora existam controvérsias sobre sua autoria.
Haviam três tribunais: o Tribunal dos Três, referidos no Deuteronômio como criados por Moisés antes de sua morte, o Tribunal dos Vinte e Três – Este Tribunal existia em todas as cidades cuja população fosse superior a 120 famílias e tinha competência originária, além da recursal já referida, quando a pena imposta fosse a de morte. Do Tribunal dos Vinte e Três, podia recorrer para o Sinédrio, composto de 70 juízes (daí chamar-se, também, Tribunal dos Setenta) cuja sede era o Templo, e que exercia funções políticas e judiciárias.
O Sinédrio, além de comportar-se como Tribunal de Terceira Instância, julgava originariamente os profetas, os chefes militares as cidades e as tribos acusadas de rebeldia – foi o tribunal que julgou Jesus de Nazaré, tido como falso profeta e acusado de heresia.
A jurista Maria Durvalina de Araújo em seu estudo – Julgamento de Cristo. irregularidades e atrocidades. Lei mosaica x processo de Jesus Cristo – demonstra as irregularidades jurídicas constatadas no processo que culminou na condenação e morte de Jesus Cristo. Da sua análise podemos constatar o cerceamento do direito de defesa, atos jurídicos na calada da noite, ausência de recursos, e testemunhas subornadas.
De acordo com o estudo da ilustre criminalista, a Lei Mosaica repudiava a traição. Porém, foi através da traição de Judas que o suposto acusado (Jesus) foi apresentado aos Tribunais.
A Prisão Preventiva não era prevista, somente sendo permitida a Prisão em Flagrante Delito. Entretanto, Jesus foi procurado e preso ilegalmente durante a noite, sem que houvesse contra ele qualquer mandado de prisão.
Não existiu qualquer investigação prévia e acusação contra Jesus, o que seria necessário, para que ele tomasse conhecimento do crime que lhe era atribuído.
O interrogatório era previsto no Tribunal. Porém, o interrogatório de Jesus feito por Anás foi ilegal, pois o mesmo já não era Sumo-Sacerdote do Sinédrio. A confissão era proibida pela lei em vigor, porém se associada a duas testemunhas formavam as provas.
O presidente do Tribunal – Caifás – vendo o tumulto entre os conselheiros resolveu interrogar Jesus (pela ordem hebraica era obrigatório responder sob juramento de testemunho).
Era imprescindível que não houvesse contradição entre as duas testemunhas. Foram aliciadas 08 testemunhas, porém tão contraditórias que os membros do Tribunal a dispensaram, sendo convocadas mais duas que também não foram concordes em seus depoimentos.
Os membros do Tribunal tinham que ser notificados oficialmente, Mas, foram convocados com urgência no meio da noite, e ainda, somente àqueles que já tinham se reunido sobre a prisão de Jesus.
Apesar de haver proibição de que qualquer parente amigo ou inimigo do acusado o julgasse, Jesus foi julgado pelos membros do Tribunal, que eram inimigos.
A prisão e julgamento de Cristo foram na véspera da sábado de Páscoa, dia em que tais atos eram proibidos.
As assembleias e Comissões dos Tribunais tinham datas oficiais para julgar, sempre segundas e quintas feiras. O julgamento de Cristo ocorreu numa sexta-feira, desrespeitando as exigências legais.
O crime atribuído a Jesus foi o de blasfêmia e o Tribunal competente para julgá-lo seria o Sinédrio . Em crimes de pena capital (Morte) o julgamento que condenasse o acusado não poderia ser concluído no mesmo dia. Porém, o julgamento de Jesus ocorreu em menos de 24 horas.
Para caracterizar o crime de Blasfêmia era necessário que Cristo pronunciasse a palavra DEUS. Então Caifás perguntou a Jesus – És o Cristo, o Filho de Deus? – e ele respondeu – Em verdade vos digo: doravante vereis o filho do homem sentado à direita do Todo Poderoso. – Jesus não teria citado a palavra que poderia caracterizar a blasfêmia.
A Lei também previa que, quando o veredicto fosse unânime pela condenação , ela resultaria em absolvição. Mesmo assim, depois de concluído o interrogatório, por unanimidade proferiram o veredicto: É réu de morte.
Para os crimes capitais o Tribunal poderia infligir quatro tipos de pena de morte: lapidação,abrasamento, decapitação e estrangulamento. A pena foi de morte, porém o Sinédrio não tinha competência para executá-la. Somente o Governador – Procurador Pôncio Pilatos é quem tinha o poder.
Após várias tentativas de Pilatos em esquivar-se de sua responsabilidade e aplicar a lei, não houve outra alternativa, por receio de perder seu prestígio junto ao Imperador, por estar protegendo alguém que era considerado pelos mais influentes de seus conterrâneos como culpado de traição. Pilatos não teve a coragem de lutar pela justiça contra esses
sacerdotes coléricos.
Era costume durante a Páscoa libertar um prisioneiro escolhido pelo povo. Pelo voto popular, as pessoas poderiam escolher dentre àqueles sentenciados à morte, o que teria o benefício.
A pergunta de Pilatos aos sacerdotes foi “Qual quereis que vos solte? [Jesus] Barrabás, ou Jesus chamado Cristo?” Eles clamaram, é claro, pela libertação de Barrabás, o notório ladrão e assassino. “Que farei então de Jesus, chamado Cristo?”, perguntou Pilatos.
Pilatos enfraqueceu diante daquela ferocidade implacável e entregou Jesus para que o crucificassem. Ele tomou uma bacia de água diante dele, lavou suas mãos nela e anunciou “Estou inocente do sangue deste justo: considerai isso”.
Assim, Jesus foi crucificado contrariando as leis romanas e hebraicas.
Por fim, diante de toda a análise, o que se pode absorver e que a Lei Mosaica era tida como imparcial e meticulosa e acaso tivessem seguido os preceitos nela contidos, não teria havido condenação, pois o que houve na realidade foi interesse político-jurídico, o que não difere muito do direito contemporâneo, com suas peculiaridades.
Fontes: Durvalina Maria de Araújo. Advogada e Membro do Instituto de Ciências
Criminais.
– Valmir Nascimento Milomem Santos