Via Opinião Crítica/Will Filho
O Brasil acaba de assistir uma decisão judicial que consolida o cenário de perseguição religiosa em nome do poder estatal contra as famílias, especialmente às cristãs, após a Justiça do Rio de Janeiro determinar a proibição da venda do livro “O que toda mãe gostaria de saber sobre disciplina bíblica”, de Simone Gaspar Quaresma.
O juiz da 1ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Capital, atendeu uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ), que acusa a autora cristã de incentivar a violência contra crianças e adolescentes, simplesmente por recomendar em sua obra o castigo físico em dadas circunstâncias contra os menores.
“A ré tem plena ciência de que o que prega é contrário à lei, tanto assim que ensina os pais a baterem em locais que não sejam visíveis, bem como a orientar seus filhos a não delatar as agressões. O perigo de dano é evidente, haja vista que os livros e vídeos incitando os pais a agredirem seus filhos estão acessíveis ao público, colocando em risco a integridade física de crianças e adolescentes”, diz trecho do despacho.
Nota-se, contudo, que o termo “vara” utilizado pela autora, se trata de uma linguagem figurativa que faz alusão ao castigo físico, e não a um instrumento literal. Em seu site observamos o seguinte trecho:
“Simone Quaresma aborda a necessidade que os filhos têm da correção com vara. Com farta demonstração de texto bíblicos, ela evidencia como a criação e a correção dos filhos são um reflexo da repreensão de Deus, um Pai amoroso”
Pelo trecho acima é possível constatar que, em primeiro lugar, a natureza da obra é religiosa e, portanto, protegida como cláusula pétrea no Art. 5° da Constituição Federal em nível de consciência e crença como fatores invioláveis, como segue abaixo:
VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”
Segundo, a liberdade de consciência e crença deixam de existir no momento em que uma decisão judicial proíbe a circulação de uma literatura que se baseia justamente em preceitos religiosos. A gravidade disso é tamanha que, na prática, a mesma lógica poderia ser aplicada à Bíblia Sagrada, já que a autora fundamenta toda a sua ideia com versículos.
Logo, não há como se falar de liberdade de consciência sem expressão, nem de crença sem a sua manifestação em termos práticos, que nesse caso é a doutrina religiosa. O livro de Simone Quaresma, portanto, sendo uma literatura que trata da doutrina cristã, expressa a sua inviolável liberdade de crença, de modo que proibi-lo é uma monstruosa censura!
Proporcionalidade
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), quando defende o direito da criança de não sofrer qualquer espécie de agressão ou tortura, física ou psicológica, obviamente está abordando casos nítidos de abusos psicológicos e físicos, os quais se diferenciam drasticamente do mero castigo físico aplicado, por exemplo, pelos pais com palmadas em seus filhos.
A própria doutrina do Direito, não por acaso, estabelece o “Princípio da Proporcionalidade” como marco regulador da aplicabilidade da Lei, exatamente para que dispositivos judiciais não sejam tomados ao pé da letra, enquadrando todos em um mesmo patamar de rigor, neste caso, de violência contra a criança.
O jurista Dirley da Cunha Júnior, por exemplo, explica, segundo o DireitoNet, que a proporcionalidade “é um importante princípio constitucional que limita a atuação e a discricionariedade dos poderes públicos e, em especial, veda que a Administração Pública aja com excesso ou valendo-se de atos inúteis, desvantajosos, desarrazoados e desproporcionais”.
Em outras palavras, significa que equiparar uma obra de cunho religioso que defende o castigo físico em condições específicas (e obviamente moderadas) como um recurso educativo, com a violência abusiva contra crianças e adolescentes, é desproporcional, exagerado e inútil.
Ainda assim, o ECA, como qualquer outro dispositivo jurídico, está sujeito à Constituição Federal. Se a própria C.F garante que é “inviolável a liberdade de consciência e de crença” e que “é livre a manifestação do pensamento”, bem como que “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica”, está claro que a publicação e venda do livro em questão é permitida, visto que a obra caracteriza a consciência, o pensamento e a filosofia da sua autora.
Ainda que o livro não fosse de natureza religiosa, mas abordasse o mesmo conteúdo por outras perspectivas, a sua venda também não poderia ser proibida, pois o parágrafo IX do Art. 5° da C.F afirma que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.”
O texto é cristalino ao falar de “atividade intelectual, artística, científica e de comunicação”. Isto se difere radicalmente da execução de práticas criminosas.
Em outras palavras, uma coisa é apresentar argumentos a favor do castigo físico para crianças (isso é atividade intelectual), ou apresentar dados científicos para isso (atividade científica), e outra é abusar (ou incentivar) de um menor física e psicologicamente.
Entre o discurso e a prática há um abismo, assim como entre uma atividade intelectual/científica e o incentivo à violência também. O que difere são os fundamentos. O juiz tem a obrigação de saber diferenciar o que são conteúdos literários legítimos, fundamentados, do que não são.
Mais absurdos
O juiz também afirmou em sua sentença:
“O livro O Que Toda Mãe Gostaria de Saber Sobre Disciplina Bíblica, em todos os trechos que trata de uso de qualquer tipo de violência (física ou psíquica) contra crianças e adolescentes, sob todo e qualquer fundamento, agride a Constituição Federal, o Pacto de São José da Costa Rica, o Estatuto da Criança e do Adolescente e as demais normas protetivas de crianças e adolescentes.”
Não satisfeito com a proibição da venda do livro, ele também determinou, pasmem, que links para palestras da autora com a mesma temática devem ser retirados de circulação na internet pelo Google Brasil (proprietário do Youtube), Facebook, Amazon e o site “Mulheres Piedosas”, sob pena de pagamento de multa, segundo o Bem Paraná
O que isto significa, na prática, é que ao colocar o ECA acima da liberdade religiosa e de expressão, o juiz abre um precedente para que não apenas livros, mas palestras e até pregações dentro dos templos religiosos, ou aulas em seminários, sejam acusados de incentivo à violência ou quaisquer outras supostas violações da lei.
Não temos dúvida de que estamos diante de um caso de absurda censura contra a fé cristã, pelos motivos já expostos e outros que certamente juristas e demais especialistas nas áreas do direito, da educação e da religião poderão apresentar.