O Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) obteve, na Justiça Federal, o bloqueio de R$ 38 milhões do Facebook por descumprir decisão judicial que o obrigava a fornecer dados de cadastros e quebrar o sigilo de mensagens trocadas pelo aplicativo WhatsApp para uma investigação. Segundo o MPF, o valor bloqueado corresponde às multas individuais de R$ 1 milhão estipuladas para cada dia de descumprimento da decisão. A medida antecede uma possível suspensão do serviço no país, junto ao WhatsApp e ao Instagram, que pertencem à empresa.
A justificativa do Facebook é que os conteúdos solicitados, relacionados aos usuários, estão “sob responsabilidade dos operadores da empresa nos Estados Unidos e na Irlanda, sendo necessário procedimento de cooperação internacional para cumprimento da decisão”, conforme informa o MPF. O Marco Civil da Internet, no entanto, autoriza a Justiça a acionar as empresas sediadas no exterior quando um dos atos – como coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de internet – ocorrer em território nacional. Além disso, o Facebook tem representação no Brasil.
Como o processo segue em segredo de Justiça, não é claro o tipo de informação que foi solicitada à empresa, pode ser um dado de registro ou o conteúdo de uma conversa entre usuários. No WhatsApp, as mensagens agora são criptografadas de ponta a ponta, o que as torna invioláveis em termos de segurança, como alega a empresa. O aplicativo, nesse caso, reitera que não tem acesso ao conteúdo das mensagens. Para alguns especialistas, a inteligência dos países acostumou-se a conseguir o teor das comunicações entre cidadãos suspeitos com ordens judiciais, medida que ficou impossibilitada com a implementação da criptografia. Por outro lado, o Facebook age de forma displicente com a Justiça, sem apresentar nenhum tipo de laudo que comprove a incapacidade de acessar essas mensagens.
O bloqueio dos serviços, no entanto, não parece surtir nenhum efeito amedrontador no Facebook, que tem no Brasil um público cativo e sempre entre os líderes de uso de suas aplicações. O próprio Supremo Tribunal Federal derruba as decisões judiciais que determinam a suspensão dos serviços. Na semana passada, horas depois de a Justiça do Rio de Janeiro bloquear o WhatsApp – a terceira vez em sete meses no Brasil –, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, suspendeu a decisão, alegando que o bloqueio não era razoável e que gerava “insegurança jurídica” em seus usuários. “A suspensão do serviço do aplicativo WhatsApp (…) parece-me violar o preceito fundamental da liberdade de expressão aqui indicado, bem como a legislação de regência sobre o tema. Ademais, a extensão do bloqueio a todo o território nacional afigura-se, quando menos, medida desproporcional ao motivo que lhe deu causa”, escreveu o presidente da Corte.
De acordo com o procurador da República Alexandre Jabur, autor do pedido desta semana, o bloqueio de bens respeita a legislação e é uma medida que antecede o bloqueio do serviço, caso a empresa não forneça os dados solicitados pela Justiça. “A postura de não atendimento a ordens judiciais claramente se caracteriza como ato atentatório à dignidade da Justiça, podendo, além da multa, vir a ser determinada a suspensão dos serviços da empresa no Brasil”, defende. Segundo ele, o Facebook “ultrapassa o limite do razoável, criando um ambiente propício para a comunicação entre criminosos”.
Os artigos 10 e 11 do Marco Civil, promulgado em 2014, determinam que a guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de internet, bem como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes direta ou indiretamente envolvidas, sendo somente disponibilizadas mediante ordem judicial. ÉPOCA entrou em contato com o Facebook, mas a empresa informou que “por ora, não tem nenhum posicionamento para compartilhar”.
Nesta quinta-feira (28), o Ministério Público e o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais divulgaram uma nota técnica para alertar a sociedade sobre a “necessidade de que os provedores e aplicativos cooperem com as autoridades responsáveis por combater os ilícitos”. “As empresas estrangeiras que prestam serviços no Brasil vêm ignorando a legislação brasileira, o que inviabiliza muitas investigações ainda em seu início e resulta em riscos como tráfico de drogas, pornografia infantil, crimes de ódio e até mesmo terrorismo na rede”, diz a nota. As autoridades reiteram que têm buscado a negociação com as empresas, mas elas se negam a “cumprir e adequar a questão do acesso aos dados, mesmo com ordem judicial, utilizando principalmente o argumento de que não se submetem às leis brasileiras”.
Com informações ÉPOCA