Por Tom Nelson*
Em conversas pastorais, frequentemente ouço uma pergunta sincera: “Pastor Tom, eu certamente entendo que amar ao próximo exige recursos, mas Jesus não nos advertiu sobre as riquezas?”
Ao longo da história da igreja, houve duas visões proeminentes e divergentes sobre a riqueza. Uma visão insiste que as riquezas materiais e a geração de riquezas corrompem intrinsecamente e, portanto, devem ser evitadas a todo custo.
A outra visão defende que as riquezas materiais e a geração de riquezas são essencialmente boas e fazem parte de nosso projeto de criação e mandato cultural. Levado ao extremo, isso pode levar à crença de que Deus abençoa seus verdadeiros seguidores com saúde e riquezas.
Podemos aprender com ambas.
Teologia da Pobreza
Uma forma contemporânea de gnosticismo, que desvaloriza a verdadeira bondade do mundo material, se esconde debaixo de muitas manifestações da teologia da pobreza. A teologia da pobreza geralmente alimenta um orgulho espiritual, cegante e pietista que afirma que quanto maior a pobreza material, mais espiritual é a pessoa. Inerente a este ensino bíblico distorcido, temos que a pobreza material traz riquezas espirituais e a abundância material inevitavelmente traz pobreza espiritual.
Em todas as circunstâncias econômicas, sejam elas sombrias ou brilhantes, é necessária uma mordomia fiel e frutífera de tudo o que Deus nos confia.
Os proponentes da teologia da pobreza estão certos em nos relembrar de muitos textos bíblicos que falam sobre os perigos consideráveis que acompanham o aumento das riquezas materiais. Também conclamam corretamente para que uma igreja ocidental cada vez mais abastada demonstre uma generosidade material maior e a uma vida sacrificial mais profunda (leia Mt 6.24; 19.16-30; I Tm 6.7-8; Hb 13.5).
No entanto, aqueles que adotam a teologia da pobreza, em suas muitas formas explícitas e implícitas, cometem um erro teológico ao casar o mal com a prosperidade material. Segundo Dallas Willard, “A idealização da pobreza é uma das ilusões mais perigosas dos cristãos no mundo contemporâneo. A mordomia, que requer posses e inclui ofertas é a verdadeira disciplina espiritual em relação às riquezas”.
A pobreza material não é mais intrinsecamente espiritual do que a abundância material. Em todas as circunstâncias econômicas, sejam elas sombrias ou brilhantes, é necessária uma mordomia fiel e frutífera de tudo o que Deus nos confia.
Teologia da Prosperidade
Uma segunda distorção perigosa em relação às riquezas materiais é a teologia da prosperidade. Seus proponentes creem que a geração de riqueza é um sinal de autenticação ou uma apologética causal direta para a bênção de Deus. Aderentes da teologia da prosperidade afirmam que Deus quer que todos sejam materialmente prósperos. Na teologia da prosperidade, está incorporada uma boa e admirável atenção ao que é frequentemente uma teologia robusta e negligenciada da bondade do florescimento humano.
Tragicamente, como na maioria das outras distorções teológicas, a verdade importante é ignorada, minimizada ou totalmente negada. Em muitos casos, os proponentes da teologia da prosperidade têm uma visão que despreza o sofrimento humano, eles tendem a ignorar o chamado das Escrituras para um estilo de vida sacrificial alimentado pelo amor ao próximo e ignoram descaradamente a soberana vontade de Deus que alguns dos seguidores de Jesus vivam em pobreza material.
Embora afirme alguns dos aspectos bons do ensino da teologia da prosperidade, John Schneider persuasivamente desafia a crença errônea de que Deus deseja que todos sejam materialmente prósperos: “É que não há tempos ou circunstâncias neste mundo em que Deus, no final, prefira que alguém seja pobre. E as Escrituras deixam muito claro que tais tempos e circunstâncias freqüentemente existem”.
A teologia da prosperidade não é apenas inconsistente com as Escrituras, mas também desafia muitos seguidores devotos de Jesus nos dias de hoje e em toda a história da igreja que enfrentam e enfrentaram grande privação material em seu aprendizado com Jesus.
Negociação Distributiva
Visto que as riquezas não devem nem ser evitadas nem elogiadas, mas sim administradas com sabedoria e generosidade, como deveríamos pensar sobre a geração de riquezas materiais?
Às vezes, presumimos que há uma negociação distributiva de riqueza ou de frutificação no mundo. A falácia comum da negociação distributiva sugere que o aumento de riqueza de uma pessoa resulta na diminuição da riqueza de outra pessoa. Podemos observar os efeitos dessa falácia em púlpitos contemporâneos. Tanto explícita como implicitamente, muitos pastores anunciam a noção de que os ricos criam os pobres em um tipo de relacionamento causal.
Uma teologia robusta da criação, no entanto, nos ajuda a ver o erro da visão de negociação distributiva. Deus projetou a ordem natural criada para que a quantidade de riquezas pudesse ser expandida através do trabalho humano.
Isto significa que o trabalho de cultivar o Jardim do Éden foi um chamado para administrar as matérias-primas da criação de Deus e criar algo que não existia antes, multiplicando-o muitas vezes para o bem estar de todos (Gn 2.15).
Portanto, vemos a geração de riquezas como uma coisa boa, porque, através dela, refletimos a nossa natureza criada e aumentamos a nossa capacidade de amar ao próximo. Fomos criados para florescermos, para sermos frutíferos, para agregar valor aos outros no mundo. Paulo escreveu: “o viver na carne traz fruto para o meu trabalho” (Fp 1.22).
Fomos criados para florescermos, para sermos frutíferos, para agregar valor aos outros no mundo.
Seja qual for o trabalho para o qual Deus nos chamou, devemos nos perguntar: estamos nos tornando trabalhadores mais frutíferos? Estamos fazendo o nosso trabalho cada vez melhor e ganhando cada vez maior habilidade? Se estamos em um contexto de trabalho remunerado, que tipo de avaliação de desempenho estamos recebendo? Se estamos buscando um nível maior de educação formal, estamos levando a sério a nossa aprendizagem? Se não ganhamos um salário regular, como continuamos a crescer em nossa contribuição para com os outros? Se somos o cônjuge que cuida da casa, como nos tornamos um pai ou uma mãe mais frutíferos?
Nossa fé evangélica dinâmica nos diz que todos os detalhes das nossas vidas são importantes. A vida frutífera que somos chamados a ter tem implicações econômicas profundas para o nosso mundo. Como aprendizes de Jesus, o mandato para dar muito fruto em todas as dimensões de nossas vidas é o centro do discipulado cristão fiel.
*Este é um excerto adaptado do livro de Tom Nelson, The Economics of Neighbourly Love: Investing in Your Community’s Compassion and Capacity [A Economia do Amor ao Próximo: Investindo na Compaixão e Capacidade da sua Comunidade] (IVP, 2017) e publicado no Brasil pela Coalizão pelo Evangelho.