A Câmara dos Deputados realizou nesta quarta-feira (26), por mais de quatro horas e 30 minutos, uma comissão geral para debater o cultivo no Brasil, exclusivamente para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais, da Cannabis sativa, planta também usada para produzir maconha.
O presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), considerou o debate histórico. “Com o enfrentamento da questão, o Brasil se somará a outros que se debruçaram sobre ela e encontraram, na medida das possibilidades, a melhor solução”, disse, em mensagem lida pelo deputado Eduardo Bismarck (PDT-CE).
A participação do ativista Norberto Fischer, pai da primeira brasileira autorizada pela Justiça a importar produtos terapêuticos a base de Cannabis, em 2014, resumiu o debate no Plenário. “Se pararmos para ouvir os discursos, todos reconheceram e aceitam o uso medicinal, o gargalo está no plantio”, disse.
A comissão geral sobre o cultivo e uso medicinal de Cannabis foi realizada a pedido do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), presidente da comissão especial sobre o Projeto de Lei 399/15, e mais 12 parlamentares (REQ 1116/21).
Teixeira defendeu o substitutivo apresentado pelo relator, deputado Luciano Ducci (PSB-PR), ao texto original do deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE). Devido ao caráter conclusivo, o texto, se aprovado na comissão especial, poderia seguir para o Senado, mas deverá haver recursos para a análise em Plenário.
“Se o Parlamento se negar a aprovar este projeto de lei – e não acredito que o fará –, concederá ao Poder Judiciário a solução do problema dos medicamentos a base de Cannabis”, disse Teixeira. Ainda não foi marcada a votação do parecer de Luciano Ducci. Antes, o relator deverá apresentar complementação de voto.
Posições distintas
Ao realizar uma comissão geral, os parlamentares reúnem-se no Plenário da Câmara dos Deputados para discutir assunto relevante. São convidados para o debate autoridades, especialistas com notório conhecimento, integrantes de entidade da sociedade civil e pessoas com experiência no tema em questão.
Nesta quarta-feira (26), parlamentares e convidados acabaram formando dois grandes blocos. Embora tenha havido amplo apoio ao uso medicinal, surgiram divergências, já que a parte contrária ao substitutivo de Luciano Ducci só aceita o uso do canabidiol, uma das cerca de 480 substâncias presentes na Cannabis.
Na visão dos deputados David Soares (DEM-SP), Dra. Soraya Manato (PSL-ES), Eros Biondini (Pros-MG), Francisco Jr. (PSD-GO), Greyce Elias (Avante-MG), João Campos (Republicanos-GO), Osmar Terra (MDB-RS) e Pastor Eurico (Patriota-PE), a proposta ainda em análise na comissão especial é desnecessária.
Esses parlamentares argumentaram que produtos derivados do canabidiol já são regulamentados no País pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Bastaria assegurar a oferta gratuita no Sistema Único de Saúde (SUS). João Campos afirmou que já existe discussão neste sentido com o Poder Executivo.
Os deputados Alex Manente (Cidadania-SP), Alice Portugal (PCdoB-BA), Chico D’Angelo (PDT-RJ), Eduardo Costa (PTB-PA), Jandira Feghali (PCdoB-RJ), Natália Bonavides (PT-RN), Rafafá (PSDB-PB), Sâmia Bomfim (Psol-SP) e Zacharias Calil (DEM-GO) afirmaram, de outro lado, que só o plantio poderá baixar os custos.
Eles saíram em defesa do parecer de Luciano Ducci, ressaltando que não há no texto nenhuma linha tratando da legalização da maconha, do cultivo individual ou do uso recreativo da Cannabis. Para Ducci, quem se opõe ao parecer tenta confundir a população, pratica desonestidade intelectual e propaga mentiras.
Os deputados Capitão Alberto Neto (Republicanos-AM), Caroline de Toni (PSL-SC), Diego Garcia (Pode-PR), Eli Borges (Solidariedade-TO) e Pastor Marco Feliciano (Republicanos-SP) manifestaram-se totalmente contrários à proposta. Em linhas gerais, disseram acreditar que será o início da liberação das drogas no País.
“Quem produz droga para vender como uso recreativo não pedirá autorização da Anvisa”, comentou o deputado Tiago Mitraud (Novo-MG), em reação aos críticos da proposta. “Isso é igual ao argumento que o governo Bolsonaro aplica para liberar armas, de que o criminoso não vai pedir porte na Polícia Federal.”
O deputado Ricardo Izar (PP-SP) aproveitou a participação na comissão geral para oferecer um depoimento pessoal. “Luto contra a doença de Parkinson há dez anos”, afirmou. “Já experimentei o canabidiol. Nas vezes em que usei o medicamento, a qualidade do meu sono e os tremores melhoraram muito.”
Fonte: Agência Câmara de Notícias