De Papuda aos palcos: Pastor Cícero e Markin FDO homenageiam 386 vítimas

Por DJ Ricardo – Programa Conexão Hip Hop

O rap nacional acaba de ganhar um marco histórico. A faixa “A Colheita (Dia dos Finados)”, assinada por Pr. Cícero e Markin FDO, é considerada a maior música de rap já produzida no Brasil — não apenas pela duração, mas pela força do conteúdo e da mensagem.

A música cita nominalmente 386 pessoas falecidas, a maioria vítimas de mortes trágicas. O tema foi inspirado tanto no filme Colheita Maldita quanto na passagem bíblica de Mateus 26:52 (“todos os que lançarem mão da espada, à espada morrerão”.

O projeto começou enquanto Pr. Cícero estava recluso na Unidade Prisional Regional (UPR) de Valparaíso de Goiás, no Entorno do Distrito Federal. Após ser transferido para o Presídio de Brasília, ele conheceu Markin, ex-integrante do grupo Filhos da Obediência, o primeiro grupo de rap gospel de Santa Maria-DF a gravar um CD — formado por Markin, Marcelo e Jhon.

Mesmo no crime, Cícero já demonstrava talento e consciência artística. Ele também fez parte do grupo Filosofia Negra, com o qual segue colaborando em composições e participações.

Depois de anos privados de liberdade, Cícero Romão e Marcos Antônio de Sousa Silva (Markin) se reencontraram em liberdade e decidiram dar um novo rumo às suas vidas. Cícero tornou-se pastor e evangelista, e Markin voltou ao evangelho em carreira solo, lançando inclusive o livro “De Frente pro Crime” — cuja primeira tiragem de 1.000 cópias esgotou rapidamente. Na obra, ele relata experiências reais vividas no submundo do crime no Distrito Federal e nos presídios da Papuda e Cascavel.

Foi ainda dentro do Complexo Penitenciário da Papuda que nasceu o projeto A Colheita. A música, além de homenagear pessoas que perderam a vida, faz uma reflexão profunda sobre a dura realidade de quem não teve o mesmo livramento para deixar o crime e a marginalidade.

Finalizada apenas em 2020, a obra ganhou um videoclipe impactante, com cenas gravadas em cemitérios e velórios. O trabalho chama atenção pela extensão e narrativa rimada, que menciona o nome de cada um dos homenageados e as circunstâncias de suas mortes — um verdadeiro documento em forma de rima.

“Uma evangelista me mandou um recado no pátio dizendo que a minha detenção era um livramento. Hoje entendo que foi mesmo”, relembra Marcos Antônio.

Atualmente, Pr. Cícero e Markin seguem firmes na missão de levar a mensagem de transformação e fé por meio do rap. Eles se apresentam em ruas, igrejas, eventos e casas de recuperação, mantendo viva a essência do hip hop com propósito.

A pesquisa para o projeto contou com o apoio de DJ Ricardo, além do aval de importantes nomes da distribuição de hip hop nacional e internacional, como DJ Marola (Marola Discos) e DJ Ney (Gringos Records).

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